30/10/08

Amei-te

Amei-te mil vezes.
Amei-te antes de te conhecer,
antes do tempo, da vida, de tudo.
Amei-te quando ainda não sabia quem eras,
quando ainda não tinhas voz, nem nome, nem idade.
E disse-to por mil vezes.
Por mil vezes to escrevi,
em bilhetes, cartas, paredes e postais.
Mesmo quando não sabia como to fazer chegar, escrevi-to.
Em esplanadas, aeroportos,
países com estranhos costumes, lugares sem nome.
Por todo esse mundo
te proclamei um amor informe, inominável, incompreensível.
Passaste mil vezes na minha vida.
Dei-te todos os nomes, todas as moradas e aparências.
Ou nem te dei nada porque não sabia como.
Cruzaste-me em dias sem sol,
em nevoeiros sem memória, em roupas desalinhadas,
ruas, becos, praças vazias,
linhas cruzadas e semáforos fechados.
Momentos houve em que me atropelaste as mãos,
cravaste unhas, chamaste-me pelo nome
e atiraste-me de encontro ao desespero.
Foste tudo sem nunca seres nada.
Acreditando em ti, vivi só mas nunca sozinh(a).
Fui a inquietação,
o desassossego amargo dos quartos de hotel por onde passei,
as lágrimas que aprendi a conter,
as malas que nunca desfiz,
o passaporte em dia e o bilhete para lado nenhum.
Fizeste de mim tudo isso e muito mais.
E de todas as mil vezes em que te amei
jurei a mim própri(a) que seria a última,
que depois dessa vez o amor secaria
como um pedaço de pele arrancada à vida
que mirra até se tornar sudário,
mortalha de ninguém.
E de todas essas mil vezes,
fracassei por completo.

Carlos Geadas

0 Comentários:

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]

<< Página inicial